domingo, 24 de julho de 2011

"Que quer dizer 'cativar'?
-É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa 'criar laços...'.
-Criar laços?
-Exatamente, disse a raposa. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas.
Mas se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo.
E eu serei para ti única no mundo..."

(O Pequeno Príncipe)

Esta fábula para crianças serve bem aos adultos. Vivemos dias em que tudo está cheio de pressa, de compromissos, de coisas a serem descobertas, repetimos o pensamento do Pequeno Príncipe: "não tenho tempo. Tenho amigos a descobrir e mundos a conhecer".
Me lembrei  então, de outra grande obra, o livro "O Banquete" do filósofo Platão, onde são discutidos vários entendimentos do amor. Um dos participantes, Pausânias, escolhe falar do amor corpóreo: "é mau aquele amante popular, que ama o corpo mais que a alma; pois não é ele constante, por amar um objeto que também não é constante (...) ao mesmo tempo que cessa o viço do corpo, que era o que ele amava, ‘alça ele o seu vôo’, sem respeito a muitas palavras e promessas feitas.".
Tomei aqui parte de duas grandes obras literárias: "O Pequeno Príncipe" e "O Banquete", para falar de dois sentimentos primordiais para existência humana: a amizade e o amor. Em nosso cotidiano esses sentimentos são muitas vezes banalizados, descartáveis e efêmeros, ou assim chamados erroneamente de amizade e de amor o que não passa de simpatia ou atração física, onde o que mais fazemos é colecionar números, como se fossem parâmetros de nossas qualidades.
Em tempos de tantas facilidades de comunicação, temos pressa, urgência de "conhecer" pessoas, de expandir nossos relacionamentos. Mas o que fazemos para cativar verdadeiramente o que julgamos ter conquistado? Não cativamos o que não conhecemos, diz a raposa. Não amamos verdadeiramente, pois escolhemos primeiramente amar ao corpo do que a alma, diz Pausânias.
Que bom seria que raposas saíssem de fábulas e nos lembrassem diariamente que somos responsáveis pelos trigos que cativamos.



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